quinta-feira, 12 de novembro de 2009

lobo

Um lobo. Tentou alcançar mesmo que ínfimo a dor de ser esse avesso. Porra, estava tão imerso em suas mundanidades, em suas pulsões. Nem podia, nem conseguiria. Você estava assim, tão pelado diante das minhas fugas. Tinha uma sincera compreensão de que esse assunto é coisa de outra norma. Um lobo. Livre, e dito com ar da maior obviedade possível. Coberto de realezas, ritualizado pro saberes primitivos, constituintes do nosso rim e das nossas tripas. Um olhar estranhado, gritando a incompreensão dos nossos modos. Celebrando uma volta para as danças histéricas, para os risos grotescos, para os fogos inconsequentes. Era lindo em meu sonho, negro todo, sagrado. Me sussurrava a mensagem dos descaminhos, e sem medo de misturar um tudo. Ai, me senti com tesão, e com a maior vergonha do mundo por ver meu pinto duro na ocasião mais religiosa que já havia experimentado.

Era um sonho. E na sua cama vivia a concretude da vigília. Um lobo. Apropriado das sentenças que o deus cristão me impunha, tangendo a liberdade que os demônios pagãos me apontavam, e vendo que tudo é tão controverso. Se o lobo tivesse fala, eu gritaria meu lugar.

O lobo não conhece meu vocabulário pequeno, talvez por isso chamou livre meu lobo. Meu lobo é qualquer coisa inventada, é loba, é loba, e tão macho em toda a imundícia histórica que esse barba azul tenha, e tão condenada quanto essas bruxas mulheres inadequadas, e tão incapazes quanto estes doentes, e tão fraco e tão burro quanto essa gente, e tão arrogante quanto o melhor de todos deveria semculpa ser, e tanto mais tanto mais diga. Sofre as penas de ferir a todos com as garras de carinho, de viver nos zoológicos relacionais, de ser maucontado por aqueles de bem. Que delícias ser livre. Saberia que todo meu grotesco é tão rude como a maciez de uma flor. Que meu hálito podre é como bálsamo de alívio, que minha insaciável fome canibal é altar de expiação, que meus dentes caninos seriam tão felinos em amores sinuosos, que minha floresta soturna seria a okupação daqueles que não tem medo de abraçá-lo.

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domingo, 18 de outubro de 2009

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meu corpo é cheio
de vida e cheio de morte
cheio de altura
e de abismo
fraqueza e força.
ele não me pertence
é das boas vontades
dos usos, dos costumes
e também dos tão
inocentes e infelizes
mundanos,
pobres pagãos
podres mundanos.
meu corpo atrai
maldições como
um santuário
de salvação de vidas
altar de redenção
de pecados
onde me sacrificam
almas e sonhos perdidos
pesos e contrapesos
das vidas pesadas
descompensadas.
macham meu corpo
seres semculpados.

sem honra ou vaidade
me sinto um cristo
por meio do qual
redimem povos de sentidos
nômades, sem lar
só procuram paz!
essa absurda,
não trilha meus pés
ando
pela beleza
tormentos.
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por hora
momentos tão plenos,
por hoje
chega,
eu quero que essa marca
saia
eu quero que esse podre
- não o suculento e brilhante,
mais nobre -
mas o podre dos homens
caia.
vou abdicar de ser
o mesmo personagem
da mesma estória,
da história da história
vou deixar de receber
os mesmos dedos
apontados
a mesma maldição
que não é
NUNCA, NUNCA
NUNCA
inerente, constituinte, inte, ante, onto
é somente atribuída!
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artistas

andam
babando uma forma
inútil de serviços
voltam
bichando uma forma
fútil de servi-los
rondam
testando uma forma
multi de vivê-los
penam
tateando uma forma
concreta de sê-los.
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já me vejo
velho amargo.
se não houver inveja
sorte do mundo
pois serei mesmo
um bruxo
com poções possíveis
menos a do poder
de cessar este fim.

já me vejo
criança isolada
alma penada
barulho irritante
e muito mais
mais muito
enebriante
que eu, asqueroso
um ébrio conflitante.

Sem poesia para ler
sem voz de declamar
ou afetos a clamar
nem cuidados, tratos
maus tratos
acho mesmo
que seria algo assim,
apesar de evocar
tão disinto fim,
é destino, é assim!
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sonhei
ontem
seu sonho
de outrem.
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Se fosse assim
fosse amor
me faria um fogo
.........................de artifício
pulando
brilhante
de um precipício.
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sábado, 11 de julho de 2009

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O que foi? Seu o que foi a irritou mais ainda. Não sei por que insiste. Não quero falar. Sobre isso, talvez. Nada, tá tudo bem. Não entendo. Nunca entendo, merda. Às vezes, tenho a impressão de que ela reage por oposição. Se me interesso, ela foge, nega. E o contrário, e o contrário. Seus pensamentos encontravam lugar e tempo. Estavam basicamente em silêncio. Ela, encostada no canto mais próprio de ser canto, no sofá. Como se acuada. Ele, recém-chegado, sentado no braço do sofá. Como se preocupado. Coitado! Tá preocupado. Mas não vou posso, nem quero responder. Significaria, para ela, naquele instante, criar uma sentença compreensível. E mais. Mal sabia o que se passava. O que é isso que se passa? Tenho vontade. às vezes, de agarrá-la tão forte, como se isso pudesse tranqüiliza-la. Ao mesmo tempo em que se irritava. Porra, será que ela pensa que devo adivinhar tudo, sempre?! Quer fazer alguma coisa? Dar uma volta, sei lá... Fez não, com a cabeça. Depois uma leve culpa a motivou melhor. Não, mas brigado. Tô pensando um pouco, só isso. Pensava demais. Pensava sobre o ideal do encontro. Quis sempre viver com se algum modo de encontro existisse. Que independesse de traços concretos, comuns. Fosse assim, algo inexplicável. Passou a compor em pensamento. É como um descuido do regular, dos deuses burocratas. Como houvesse um pleno, ocasião fugidia, sem palavras. Ele passou a lembrar de coisas que o incomodava nela. Caminhava por aí. Louça suja, roupa no tapete, bebedeiras exageradas, coisas, coisas. Sempre sonhou, assim meio ao certo sem saber, com um encontro assim. Como se em certo desenho cósmico, houvesse a fusão de átomos completos que criasse um sentido total. Como se não importasse o nome, o rosto, o sexo, o corpo. Como se não precisasse ser toque, ou sexo, ou beijo, ou tapa. Mas algo que pudesse fazer sentido, um sentido tão visceral, tão primitivo, que perdesse valores, perdesse a ética, perdesse a forma. Pudesse ser qualquer coisa assim intransitiva. Vamos fazer algo pra comer? Ele ainda pensava. Cabelos no ralo, ciúmes, ronco. Tá na hora, né?! Ser humano é realmente algo solitário. Vinho?
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segunda-feira, 6 de julho de 2009

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(cartaz de Andy do filme "Querelle" Warhol)



meu desejo delinquente
ainda longe de querer
algo que, francamente,
deveria ser.
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como sempre
me toca
como nunca
como se fosse
diferente
como se
sentisse
como eu.
Essa ilusão
insurgiria
como nova
assim como
um ingênuo
pensando em
como ser feliz.
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domingo, 3 de maio de 2009

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(Desenho de Helio Feijó)

quando aprender a doer
amarei um pássaro.
nem percebi
que as folhas são tão
inaltas, se faz vento
nem cai.

Aprendi uma vez
a passarar, e amei a dor;
meu salto desprezou de quanto
o ninho
que pranto que faz
porque a sina é boa
e a rima não tanto.

Olhei uma vez o amor
de um pássaro doído.
rio não some
de a gente querer.
abracei quão forte
esse poder
enquanto pude.
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domingo, 5 de abril de 2009

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Eu disse: eu queria fazer uma coisa diferente, não sei, marginal. E você disse não entendo, para quê. Nem sei, a vida ensina coisas e se faz mesmo, faz tanto errado. Palavras tortas, meio louco, meio paixão. Assim demonstra alguma coisa que caiba nos pensamentos. E exploda. Não sei, não é por sentido. Possível sermos todos tortos, todos sofríveis pela norma, todos pequenos seres desejantes, redundados a esfera dos josés e fernandas sociais. E você, e eu. E nós, onde entramos. Você disse nós, nunca antes disse. Nós com um sabor de filosofia moderna, ou daquelas gregas, cheias de valor e opressão, como um café da manhã do século dezoito. Me senti como uma mulher de casa, dona mesmo, tarefa de tarefa, sem abrir a boca. Pensei isso devia ser bom também. Tudo no lugar certo, seja lá que porra. Que pleno será ser obrigado às coisas. Você espantou. Perguntou como. Negando uma série de transformações sociais relevantes. Libertação, emancipação. Essas balelas. Lembrei de nós. Nós é tão passado, muito passado, ultrapassado. Nem macho, nem fêmea, só efêmero. Efeito e causa de forças sem nome. Olhei para a conta de luz. Com meu nome. Você me viu. Riu. Se nós fôssemos alguma coisa até poderiamos não ser.
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quarta-feira, 21 de janeiro de 2009

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Limpou-se toda plena. Não queria lhe falar mais nada. Nem foi bom, nem que horas vai, nem nada. Queria somente que saísse dali, logo, como foguete. Não sentia culpa nenhuma, nenhuminha sequer, por deixá-lo acreditar em seu pequeno castelo de areia. Ele é crescido. Mas, sim, sabia que se entregara como uma deusa louca, cheia de domínio e de tão divina, uma pequena menina, quase virgem, quase descobrindo timidamente, o que uma chupada é capaz. Não gozou. E achou basicamente idiota seu orgasmo. Que necessidade! Queria ver se não ejaculasse. Como seria? Experimentou leve poder por prescindir de gozadas. Não, vou ficar mais um pouco aqui. Tudo bem. Sim, claro. Tchau.
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