sábado, 13 de julho de 2013

DESPEDIDA DE UMA FILHA DE ÍTACA

PRIMEIRO ATO

A filha da ilha:
- Da terra sou filha e irmã.
Assentada no chão, a raiz dos meus pés é pagã,
Enfrenta os ventos do norte, os sopros do sul.
Vivo de cultivar invernos.
Recolho desalentos do jardim e,
como bem ensinada, espero.
Mais tardar amanhã, Senão depois.
A primavera vinda, promessa inda...
Todo dia faço arroz, pra mais de dois.
E sobra. Fica um resto do absoluto, sempre.
A fome do eterno sacia nunca.
De espera eu chamo a sala, o quarto, a alma,
velhas cartas, memórias, sentimentos, muita tralha
empilhadas tantas caixas. Infinitos fios de malha
todo dia a tecer
toda noite a desmanchar
eternos tecidos retecidos
Tramar a malha da eternidade
É como andar por toda parte
Sem viver lugar algum.

SEGUNDO ATO

A filha dos ventos:
- Dito e feito, como recado ingrato.
Irremediável, na vida cada um se encarrega
Dos próprios desatos.
Infindável, a espera. Que me salvem
de algo que não sei, talvez de  mim.
Foram meus ardis - ou meus quadris
tantos meios de evitar o fim.
Mas nó não é elo. Fantasia
não se cobre com manta.
Deixo aqui a ilusão de continuidade,
minhas ferramentas de imortalidade...
Não carrego bagagem
Só a que cabe no corpo;
e no coração medo. Medo sem fim
Sem rumo, sem mapa, sem aspas.
Abdico-me do vício de autorizar
para o ideal de alguém – a odisseia
minha é em qualquer lugar
Ficam fantasmas, avistam-se monstros:
tantos titãs que eu puder batalhar!
Que seja eu mal criada,
Mas a quem possa interessar,
minha ânima é corajosa.
O feminino não é carregar o peso
Do eterno recomeço.
Fecho a porta, não digo nunca mais
Este sorriso, se tentasse decifrar:
Até logo, talvez até jamais.

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