Recolho alguns pedaços de sonhos no chão para que não se quebrem por completo. Eles ainda trazem um sinal, uma imagem, um algo, que me permite reconhece-los. Guardo-os bem guardados, enrolados, embrulhados, por ora não tenho força para vê-los. Tento apanhar alguns ideais, algumas rebeldias, algumas palavras fortes de momentos precisos. Sinto o coração aflito de tão desacreditado, e depressivo de tão ansioso. Ando mil passos, deitado na cama, jogado no chão, ou caminhando com os pés. Sigo uma ou outra inércia e recostado em qualquer vagão, observo o mundo ruir por completo. Engraçado, o mundo cai aos montes, de prédios a teorias, de carros a hipocrisias. Parece não incomodar ninguém. Meu mundo desaba e ninguém vê. Forço aquele sorriso suficiente ou aquela conversa sem diálogo. Parece bastar. Tento decifrar o convite da vida. Me tranquiliza sua presença, me deixa com uma certeza profunda de que vivo, e que vou viver. Digo: eu quero viver! dentro de um carro temeroso que meus pés me desobedeçam. A vida não anda longe da morte. Toda energia, todo tesão, de toda arbitrariedade que se possa inventar para viver e que possa produzir algum suspiro profundo, ou um sorriso inegável, ou uma certeza inabalável, todo isso tudo, parece me fazer uma charada, daquelas que édipo se fudeu. Ou ele acertou?
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